12 março 2006

Pandora e Outras Lendas

"Prometeu deu ao homem o olhar altivo para aproximá-lo aos deuses e assim diminuir suas diferenças, mas, pouco determinado, o deixou a espera estático, foi Minerva quem o preencheu de alma concedendo animação e movimento."

Desconfiado evitava meus guardados, reservavam um mistério como se existisse uma história paralela que queria, mas, que não devia ser contada. Dilema: preservados, confundiam-se como fatos incompletos à procura de um único e incompreensível significado; soltos, aceitariam-se conflitantes e poderiam se perder em fuga sem que talvez fosse possível um dia novamente associá-los.

Conhecia a lenda, mesmo que fosse pela cultura do inconsciente, da nata sabedoria da genética que as vezes indica mas nem sempre ajuda, ou, e é mais provável, da herança das palavras mal divididas, oferecida não de forma absoluta, numa frustrada tentativa de aproximação que não se concretiza, prometeu, mas por não ser tão imbuido permitiu ao poder algo de inútil, frígido.

Havia de tudo entre o retido, de sentimentos a imagens até a partes de tempo mal determinados e símbolos, muitos símbolos, soltos junto aos vagos sentidos misturados. Âncoras presas a um fundo falso seguravam como presilhas um transparente e leve manto de melancolia acinzentada, fios de tristeza enredavam ainda mais o conteúdo camuflando a compreensão, o interesse e a iniciativa. Imobilidade!

Faltavam alguns dos personagens, seus papeis aparecem embaraçados, dar a força mas não a vida, conhecer o castigo pelo fogo e a fúria, mas, mesmo assim, enfrentar e ter coragem, é paradoxo assim como firmar sem garantir um propósito, é imperativo a busca por outras divindades, cadê Minerva, coitada, se até Prometeu tem duas faces e levou Júpiter a escolher ossos e não a carne, de castigo tirou-nos a chama e qualquer outra capacidade. Pandora surge, pura curiosidade, mulher, revela a Epimeteu que também escondia suas verdades, e, sem permissão, espalha dele todas pragas e maldades, embora há quem escreva que eram bens e qualidades, mas se isso é mitologia, preciso voltar à realidade.

Quanto tempo desacompanhado, acondicionando história e utopia em forma de retrato e de mensagem, também me faltaram elementos, não me reconheço em alguns dos meus atos, anseio, em desesperado aguardo, então descubro no instinto o que Vênus, Mercúrio e Apolo criaram por sabedoria como possibilidade, a figura mítica da mulher compartilhada, necessária para desembaraçar-me deste emaranhado, frágeis nós do impedimento, até desvendar por todo o tênue tecido que escondia o verdadeiro sentido e valor de meus pertences, daí, pelo interesse facultado, encontram-se finalmente associados atributo e sentido, organizados, e já sem amarras, não desejam mais fugir atormentados, pelo contrario, formam um único e plausível significado: a esperança.

Enquanto isso Minerva, mesmo distante, descansa mais realizada.

Obs: Este texto foi lido no programa Lugar aos Outros 06, produzido em Portugal pelo Estudio Raposa na voz de Luiz Gaspar o link esta na primeira página deste Blog.